13.10.13

Nem só de pão vive o homem



Nem só de pão vive o Homem, diz-nos Mateus na Bíblia. Mas a verdade é que o pão faz falta. Sobretudo em montanha!

Uma das particularidades de uma viagem de trekking é a logistica associada. As mais complexas são sem dúvida as realizadas em autonomia - alojamento, víveres e tudo o que é necessário deve ser transportado pelo próprio caminheiro. Nos Picos, a opção era mais suave: cada um tinha de levar os seus mantimentos para o almoço, saco-de-cama e roupa, mas a dormida e jantar estavam assegurados por refúgios e albergues ao longo do percurso.

Ainda assim a escolha do menú a consumir durante o dia não era propriamente fácil. Fruta fresca é saudável e sabe bem, mas tem o inconveniente do peso e volume. Barras energéticas, chocolates e bolachas apresentam um grande potencial energético, mas são por norma muito (demasiado) doces e algo enjoativas. Conservas estão praticamente fora de questão, pelo peso da embalagem. Comida processada não é na maioria das vezes muito considerada, por motivos de conservação numa viagem de vários dias, no Verão. O que, convenhamos, começam a ser demasiadas restrições.



Previdente, preparei para a viagem o mínimo olímpico no que ao peso diz respeito, porque quase tão mau como ficar com fome é soçobrar a um peso excessivo na mochila. Só que, ao fim de 2 ou 3 refeições de barritas, sumos e afins, decidi que chegava. Adoptei nova técnica: abastecer-me do que encontrasse no caminho. 1 ou 2 maçãs aqui, uns chouriços ali, salmão fumado acolá e pão caseiro onde o encontrava. Não sei bem porquê, isso granjeou-me uma fama imerecida entre o grupo: comilão!

A verdade é que há quem tenha metabolismos acelerados. Talvez seja o meu caso. Mas nada mais delicioso que parar após umas horas de caminhada, num prado viçoso com vista deslumbrante para cumeadas pontilhadas de um branco que já não seria suposto ali estar nesta altura do ano, escutando em redor o chocalho de vacas ociosas que vagueiam aparentemente sem destino, e saborear um repasto nutritivo, variado e, sobretudo, apetitoso! Na caminhada deste Verão o ponto alto foi, creio, o fuet. Um enchido típico da Catalunha, mas que se encontra por toda a Espanha, seco e algo duro, que se conserva por longos períodos sem frio. Num pãozinho, cortado cirurgicamente por uma clássica navalha Opinel nº 6 Carbonne, não poderia haver melhor!





Mas nem só de prados e vistas largas se fez o roteiro gastronómico. No regresso ao ponto de partida, ao fim de 5 dias a comer o que era possível, Potes pareceu um oásis. Numa das pequenas vielas da acolhedora cidade, uma tasca à espanhola: presuntos tetricamente pendentes do tecto, o chão cheio de beatas, cascas de pevides e guardanapos amarrotados junto ao balcão, e uns belos personagens, do tipo dos que chegam de bicicleta, calçados com chinelos de quarto, camisa de flanela ao quadrados e um colete reflector verde-choque, para o que der e vier! Após 15 minutos de um diálogo desigual, a roçar o monólogo, intercalado por uns tímidos "Hum", "Pues", "Por supuesto" que eu ia pronunciando sem grande convicção e em que se versou aleatoriamente sobre o mercado internacional, a carne argentina, as trutas do rio e as alterações climáticas, consegui finalmente um momento de tranquilidade, numa esplanada da qual se contemplava descaradamente a fauna circundante, acompanhado de um queijo Cabrales sublime! A vida na montanha é bela!


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