Interior. Profundo. Estas são palavras que automaticamente me activam e fazem viajar de olhos fechados, mesmo que rodeado de multidões ruidosas, no bulício da cidade...
Ainda que em qualquer país menos sofisticado (leia-se interessante) possamos experienciar tal ambiente, um dos locais onde mais recorrentemente o tenho encontrado é na fronteira sul da Polónia, ao longo da extensa cordilheira dos Cárpatos Ocidentais, no extremo Oeste do longo "S" invertido que estas montanhas desenham no âmago da Europa. Remota (para standards do Velho Continente), alcança-se a partir de Cracóvia, a capital imperial deste país, por estradas sinuosas que correm numa linha Este-Oeste, paralelas à divisão política e geográfica do país.
Numa das viagens mais marcantes que ai fiz calcorreei vales e montes durante 3 semanas, sem destino fixo, abandonando-me ao sabor das curvas de estradas onde não passariam 2 carros em simultâneo, na ânsia da descoberta que cada aldeia poderia trazer. É incrível como, mesmo antes de GPS e smartphones 24/7 ligados à net, a novidade espreitava a cada esquina e o contacto com paisagens e gentes deslumbrantes surpreendia. Muitas das aldeias nem sequer placa de nome tinham. Outras, lembravam resquícios de um regime socialista há anos desmembrado. As igrejas, de madeira, impressionavam pela austeridade bela, espartana, despojada, enquanto celeiros e casas construídas de troncos maciços desafiavam o passar do tempo, num equilibrio instável mas, paradoxalmente, inspirador de confiança.
Algo de que em Portugal sinto falta é o conceito de "alojamento rural". Bem sei, turismo rural existe, e com unidades bem charmosas, por todo o país. Mas de "rural", pouco têm, sobretudo no que ao preço diz respeito. No mundo eslavo é quase impossível encontrar uma localidade, por mais remota que seja, que não tenha alguns quartos preparados para receber hóspedes. Nos locais mais conhecidos, podem ser até edificios inteiros dedicados a tal. Nos mais afastados, apenas uma divisão da casa. Aconteceu-me em Komancza, uma pequena aldeia que ostenta orgulhosamente 3 igrejas activas de outros tantos diferentes ritos (Ortodoxa, Católica e Rito Oriental), onde eu sabia de antemão existirem vários destes alojamentos. Ao final de um dia longo, comecei à procura. Mas, a cada porta que batia, a resposta era a mesma: -Nie ma wolne pokoje! (Não há quartos livres). Ao fim de uma dúzia de respostas idênticas, justificadas por um evento de montanha que iria acontecer no dia seguinte, comecei a antever uma noite (mal) passada no diminuto carro alugado... Até que, já o dia sucumbia, vi uma senhora a arranjar o jardim da sua casa térrea. Aproximei-me e, sem grande esperança, perguntei se tinham quartos. Ela olhou-me, pouco convencida... e algo hesitante, balbuciou -Tak. Sim!!! Ia dormir numa cama! Bem... mais ou menos. Eu pagaria o que fosse, mas é sempre boa prática perguntar o preço... ela olhou-me, sorrindo, e atirou-me: -30 zlotys?! (€7,5). Pois claro que sim! Não sabia que o preço incluia fazer a minha própria cama num sofá com idade para ser meu avô, com a ajuda da anfitriã, mas é sempre uma boa ocasião para ir conversando e quebrando o gelo. A casa de banho era partilhada, e entre as idas do marido e do filho, lá arranjei vaga. Mais próximo da vivência quotidiana de uma família tradicional polaca não poderia estar! A noite, essa, foi passada em profundo descanso, e o amanhecer não poderia ser mais deslumbrante, com o sol rasante a roçar a cumeada da montanha que, solene, guardava a pérola da etnografia polaca que Komancza é.
Alguém já ouviu falar desta aldeia? Dificilmente. Mas vale a pena?! Sem qualquer dúvida!
fantástica esta ultima foto!
ResponderEliminarE não faz total justiça à paisagem, que é absolutamente deslumbrante! :)
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