10.11.13

"Habemus capa!" na National Geographic

 
"Habemus capa!" Palavras significativas para um fotógrafo na National Geographic Portugal, vagamente inspiradas num certo e determinado ritual religioso global mas que, em dada altura, nos parecem mais importantes que as originais.

Uma das mais delicadas decisões editoriais que a redação de uma revista tem a tomar é a escolha da capa. Sobretudo nas edições mensais, em que o sucesso da venda de todo o trabalho de um mês depende, em boa parte, dessa opção. Ao longo dos 10 anos de colaboração com a National Geographic assinei três - a última das quais presentemente nas bancas no número de Novembro, uma edição especial sobre a rede das Aldeias Históricas.

A este propósito farei nos próximos dias três posts sobre as três fotografias de capa, numa visita guiada pelos bastidores da sua criação. A primeira, em Junho de 2008, versava sobre as energias renováveis, ramo no qual Portugal, em finais da década passada, se encontrava na vanguarda europeia. Sendo a minha área de formação académica, e tendo eu trabalhado vários anos numa empresa de energia eólica, surgiu como uma proposta natural que fiz à revista, indo ao encontro de uma ideia que também do lado de lá já germinava.

No caso desta fotografia, persegui um conceito visual abstracto desde o início. Como já havia subido por diversas vezes ao topo de um aerogerador, conhecia a visão quase omnipotente que de lá se tem sobre um parque eólico, ao nível das nacelles, olhos nos olhos com o rotor que cinge 3 gigantescas pás, pás essas que, presentemente, podem ultrapassar os 75 metros de comprimento! Mas estar no local certo à hora certa para conseguir essa imagem revelou-se bem mais difícil que o esperado. Apesar dos contactos pessoais que tinha na indústria (e que me foram absolutamente essenciais), sempre que propunha a um dos fabricantes subir à torre a criatividade de justificações para o "Não!" parecia não ter fim: ora era por questões de segurança, ora era porque o parque não podia parar para se fazer uma fotografia, ora por políticas de sigilo industrial (implicitamente caía sobre mim a suspeita de espionagem industrial!), de tudo um pouco ouvi.

A verdade é que, após grandes diligências e a intervenção de um ex-colega, lá obtive o tão desejado "Sim"! Em Viana do Castelo, ao dealbar de um dia frio mas incrivelmente límpido, com um céu polvilhado de nuvens dignas de desktop do Windows, lá marchei em direcção a uma enorme torre Vestas. Esta, ao contrário das que já tinha visitado, possuia elevador, uma pequena-grande minudência que poupava um esforço considerável de subida.

Lá em cima, a nacelle apresentava o tamanho de um pequeno autocarro. O tecto do aerogerador abria-se, deixando entrever o azul celeste. Munido de capacete e arnês, lá me elevei a força de braços. Estar em pé a 80 metros de altura, preso apenas por uma corda e sem qualquer outra segurança que me separasse do vazio incrivelmente magnético que me parecia chamar do solo, exigiu uma dose de concentração considerável. A ideia era sobretudo mostrar que estava sobre um aerogerador, mas tendo uma visão abrangente sobre a paisagem, sobre as restantes turbinas. As nuvens, felizmente presentes, deixavam nas encostas as suas sombras, realçando a tridimensionalidade da paisagem. Usando uma grande angular, que mostrava o "V" das pás, em primeiro plano, procurei enquadrar o cenário serrano, com o Atlântico em fundo. Numa fracção de segundo, a imagem que perseguira durante meses cristalizava-se na minha retina e no sensor da máquina fotográfica. E embora a última palavra na escolha final da fotografia de capa seja do director e editor de arte, os fotógrafos têm naturalmente as suas preferências. Neste caso - e para variar - as opiniões coincidiram.


7 comentários:

  1. Anónimo10.11.13

    Pois é António, bela capa! Esta edição, assim como as outras todas da NGP, continua cá em casa.

    Rui Vale

    PS: em Viana do Castelo, mas em que parque mais especificamente?

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  2. Para além do risco e da tenacidade, o fotógrafo tem sempre o imponderável do tempo. Um céu assim tão azul polvilhado de nuvens, o facto de se ver, em primeiro plano a forma angular da turbina e, sobretudo, a capacidade do fotógrafo, fazem com que o resultado seja espetacular.

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  3. António, muitos parabéns pelas excelentes capas e entusiásticas reportagens fotográficas que marcaram estes 10 anos da NG. Ainda não tive oportunidade de ver a tua exposição mas as revistas foram sempre folheadas ao longo destes anos.
    Excelente ideia esta de nos dares o making of das fotos de capa.
    Já agora, desculpa o atrevimento, porquê esta a capa escolhida para a edição especial deste mês? Eu gosto da foto, mas...;)

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    1. Carla, esta capa não é a deste mês, mas sim a primeira que publiquei, em Junho de 2008, sobre energias renováveis. Farei um post sobre a edição agora nas bancas dentro de dias.

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  4. Expliquei-me mal António...referia-me realmente à capa da revista de Novembro de 2013, Foi apenas uma pequena provocação :-)...pois fiquei mais seduzida por outras das tuas propostas de capa.

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    1. A escolha da capa é um compromisso difícil de conseguir... e a opinião do fotógrafo nem sequer é o elemento primordial :-).

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