Quem já viajou comigo em grupo sabe que, ao visitar uma cidade com tempo limitado, privilegio a vivência quotidiana a um siteseeing frenético. Sinto que deambular pelas ruas de uma cidade é muito mais enriquecedor que enfiar-me em museus (por muito interessantes que sejam) ou aguardar em filas intermináveis para visitar as principais atracções turísticas locais. Adoro sentar-me num banco de uma praça ou em qualquer esplanada com vista para a cidade, observando, parado, o bulício que por mim passa.
Haverá um certo voyeurismo nesta postura, admito. Mas ainda hoje me recordo de duas tardes que passei na Porta de Almedina, em Coimbra, em reportagem para um artigo sobre Afonso Henriques, para a National Geographic. Como marcar uma reunião com a personagem se revelou assaz difícil, resolvi investir numa metáfora, passando largas horas a observar e fotografar o quotidiano de um dos últimos vestígios da sua época na estrutura urbana da antiga capital portuguesa. E, ao fim de algum tempo, apercebemo-nos de um ritmo próprio, de gente que vai e vem - os turistas, os estudantes, os idosos, os mafiosos, os imigrantes, os profissionais, os moradores - toda uma fauna humana de cuja vivência eu nunca me aperceberia se não tivesse tomado o tempo certo para observar. E isso reflecte-se na fotografia. Oportunidades há das quais apenas tomamos consciência quando dedicamos tempo e foco a um tema, um local, uma ideia...
De uma outra vez, na primeira de muitas viagens que fiz a Marraquexe, abanquei durante horas, literalmente, num dos múltiplos restaurantes desmontáveis da Djemma El Fna, a mítica praça central da cidade marroquina. Escolhi um de esquina, virado para o enorme vazio que se estende quase até à Koutobia, cuja silhueta se ergue ao fundo, contra o sol incandescente do ocaso, com laivos de fogo emprestados pelo deserto, ali tão perto... E deliciei-me com o infindável, exótico e inebriante espectáculo de cor, forma, movimento, som e cheiro que diante dos meus olhos incrédulos se desenrolava!Regressando ao presente, Viena foi a minha mais recente experiência de viver a rua. Cidade icónica da cultura centro-europeia, revelou-se para mim uma descoberta tranquila, sem sobressaltos. Guiado por um estrangeiro, tive o privilégio de percorrer as suas velhas avenidas e centenários parques acompanhado por quem os havia conhecido apenas recentemente, com um olhar ainda fresco e deslumbrado. Gostei da forma como o povo usufrui dos espaços públicos, como a ordem germânica é aqui posta ao serviço do bem comum: esplanadas, ruas pedonais, ciclovias, jardins, bancos... Não é a meteorologia a ajudar, isso é certo. É, sim, a atitude. Quanto aos museus, que sei deslumbrantes, a ópera, que dizem inolvidável, e o palácio da Sissi, que apenas vi por fora... terão de ficar para uma próxima!
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