22.5.14

Brilho sombrio




No Dubai tudo é superlativo. E há a mania do “maior do mundo”, mais ainda do que entre os portugueses, que se ficam pela “maior árvore de Natal do mundo”, ou a “maior feijoada do mundo”! Naquele território é mesmo tudo à grande: o mais alto edifício do mundo, o maior centro comercial do mundo, o maior hotel de 7 estrelas do mundo, e por aí fora. A cidade é, sem dúvida, uma ode ao engenho humano do sec. XXI, um parque de diversões ao ar livre para engenheiros civis e arquitectos! A quantidade de arranha-céus é impressionante, a diversidade e originalidade dos mesmos também, e as ruas são alindadas por não menos maravilhosas bombas automóveis, que rugem na passagem a verde dos semáforos das largas e aparentemente infinitas avenidas. Uma simples ida às compras mais parece uma visita a uma feira automóvel. Comecemos nos desportivos: Porsche é coisa banal,  Ferraris vêem-se aos pares, Maserattis, Aston Martins e McLarens são avistamentos comuns. Para os mais conservadores,  Rolls Royce e, sobretudo, Bentleys, abundam. Tudo brilha, desde o asfalto iluminado pelas luzes de montras luxuosas, até ao píncaro das torres de cristal.



Mas... mas se sairmos do Downtown, se rumarmos a Deira, à zona dos souks na margem norte do Creek, e sobretudo se formos aos arredores da metrópole, onde as areias do deserto ainda reinam e lutam pela sua honra contra o betão impiedoso, o cenário muda radicalmente. Tal como o tom de pele das gentes que por lá deambulam. E o interesse para um viajante sequioso de autenticidade cultural. Indianos e paquistaneses, filipinas e indonésias, a miríade de nacionalidades e etnias explode como as flores silvestres desabrochando aos primeiros raios de sol primaveril. A percentagem de emiratis (os nacionais dos Emirados Árabes Unidos) é pequena, quando olhamos para a população total do país. São os emigrantes a sua verdadeira força motriz.


Mas são-no na sombra. As diferenças sociais são absolutamente assustadoras: entre os sheiks do petróleo e os tubarões do imobiliário e os trabalhadores da construção civil e amas asiáticas há um fosso que parece inimaginável num território tão pequeno e, aparentemente, tão pacífico. A escravatura, de facto, existe. Mas não como no tempo dos Descobrimentos – os grilhões pesados e ferrugentos são outros agora, mais insidiosos mas não menos grotescos – trabalhadores trazidos ao engano de países pobres e populosos, passaportes apreendidos pelos empregadores, “salários” que por vezes não ultrapassam os $100 mensais, num país onde o custo de vida não é barato, em condições de alojamento desumanas… A lista continua.

E depois há aquela sensação de artificialidade constante, como se tudo fosse de plástico, ilusório, pronto-a-consumir, sem tempo para o tempo lhe emprestar a patine de bom gosto - que, admito, talvez seja uma etnocêntrica deformação europeia…



1 comentário:

  1. Um texto (cujas fontes não pude confirmar, mas que bate certo com muitas histórias similares que escutei acerca do Dubai):

    https://www.facebook.com/drsubramanianswamy/photos/a.118146701658320.18858.107229389416718/323782171094771/?type=1&theater

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