2.9.13

Legado sombrio



Já se sabe que a História é escrita pelos vencedores. E nem sempre o que nos chega ao conhecimento é um espelho cabal da realidade. Basta conversar com uns quantos jovens chineses, abaixo da faixa etária dos 20, para o comprovar: a maioria nunca ouviu falar do massacre de Tiananmen, em 1989. E os poucos que sabem parecem não querer saber... A informação é poder. Ontem e hoje.




No centro da Europa, e sobretudo na Polónia, é o oposto que se verifica: as marcas da Segunda Grande Guerra Mundial estão marcadas a fogo. As sombras da História não se dissiparam, mais de meio século passado. Especialmente em Varsóvia, onde a população se rebelou contra a ocupação alemã e que se viu totalmente arrasada como retaliação, a sua presença chega quase a ser opressiva: em cada rua, a cada esquina há memoriais sobre os polacos caídos, heróis populares que as flores vivazes comprovam estarem presentes no coração dos seus descendentes. E, para os mais atentos, o paralelismo do que se passou em Varsóvia em 1945 e em Grozni, na Tchetchénia, em 1997-2000 é assustador: capitais totalmente arrasadas como símbolo de vingança, lembrança de um poderio militar que, apesar de toda a sua potência letal, não mata a resistência dos cidadãos comuns.

Na minha opinião existem dois locais que personificam, como nenhum outro, o episódio negro que o Holocausto representou para o continente europeu: Auschwitz, o icónico campo de concentração alemão, onde mais pessoas foram exterminadas na história da Humanidade, e um outro, muito menos conhecido mas, de alguma forma, igualmente tétrico: o cemitério judeu de Varsóvia. A paisagem é digna do mais recambolesco filme de zoombies, sem necessidade de adereços: campas tombadas, milhares de túmulos semi-abandonados, raízes de árvores levantando lápides, um emaranhado de rocha e matéria orgânica que se juntam num abraço escuro que tanto tem de belo como de assustador, ao pensarmos na dor e no significado das datas que em muitas se conseguem ainda ler, destacando-se 1943, 1944 e 1945, coincidentes com o levantamento no gueto judeu e posterior rebelião geral de Varsóvia! Embora nos últimos anos a comunidade judaica tenha levado a cabo um esforço de recuperação e manutenção do espaço, a inelutável realidade é que milhares de famílias simplesmente foram eclipsadas da existência, e com elas a capacidade de alguém cuidar do espaço em que as campas se encontram...




Ainda que por motivos sombrios, é um local que vale a pena visitar, que tanto tem de doloroso quanto de pacificador. A sombra da História está lá, pesada, mas de vez em quando a luz rasga-a e a esperança de que tal não se repita instala-se.

"The one who does not remember history is bound to live through it again". Em poucos locais se adequaria melhor esta frase.


4 comentários:

  1. Para o ano que vem ocorrerá o 70 aniversário do Dia D na Normandia em França.
    Infelizmente não vou poder ir lá dado que tudo mudou na minha vida!

    Continua a postar que eu vou continuar a acompanhar.

    Grande abraço.

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  2. sem dúvida, um local carregado de história...

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    1. É. E por mais vezes que lá vá, o peso não desaparece.

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